quarta-feira, 31 de agosto de 2011

A minha morte

Ontem eu pensei na minha morte.

(Antes de mais nada, acalmem-se, eu não sou um suicida e isso aqui não é uma carta-testamento ou coisa que o valha.)

É sério!

Estudei mil maneiras de escrever isso usando alguns eufemismos. Pensei até em não escrever, afinal eu já escrevi um poema sobre a morte - "Surpresa" é o título - mas não teve jeito.
Porque foi mais que um pensamento, foi uma sensação tão real e viva (que paradoxo!), que eu não poderia deixar de registrar aqui.
Hoje eu pensei, senti e chorei a minha própria morte. E fiz isso sob algumas variadas perspectivas, o que julgo perfeitamente compreensível quando ainda se está vivo.
A primeira coisa que me veio à cabeça foi o "como" eu morreria. Em instantes eu me vi debruçado sobre o teclado do meu laptop, vítima de um ataque cardíaco fulminante (claro que eu não vou querer sofrer antes da passagem!).
Assim eu fui encontrado: cabeça pousada sobre o laptop aberto. Na tela, logado em uma das minhas redes sociais o início de um texto que eu jamais viria a concluir.
Depois do trauma indescritível de um familiar meu me encontrar cadavérico - cena pela qual eu passei bem rápido, obviamente - passei a fantasiar com muita lucidez como seria cada um dos demais familiares, amigos, ex-namoradas e conhecidos recebendo a notícia do meu desencarne. Eu pude sentir a reação de choque de cada um deles. Era muito real, assustadoramente real!
Nessa hora comecei a chorar compulsivamente. E o mais estranho é que eu não chorava as consequências da minha morte na minha vida - e isso não é um trocadilho! - mas chorava a consequência na vida de cada um deles(as). Foi então que eu quis interromper o pensamento, mas o teatro mental não fechava as cortinas e, em instantes, meu velório estava organizado.
Eu passeava tranquilamente entre as pessoas, completamente consciente de tudo o que se passava, mesmo assim sereno, olhava para meu caixão e ficava ouvindo os lamentos de cada um em particular. Embora nesse momento eu já não chorasse mais, como isso doeu! Sobretudo quando se tratava de minha mãe e de minha irmã.
A todo momento um homem calmo que me acompanhava dizia com sensível educação: "Agora chega, Ronaldo. Vamos embora."
Embora eu não respondesse nada ao homem calmo, ele parecia ler meus pensamentos que diziam: "Não, ainda não! Quero ficar mais um pouco."
Uma pessoa então aproximou-se do caixão e, alisando-me a barba com ternura, disse: "Pena eu não ter conseguido te dizer mais uma vez o quanto te amava! Você foi muito importante na minha vida."
Continuei passeando entre os presentes. O salão estava lotado. Por todos os cantos, as expressões da perplexidade ante uma morte tão repentina e, de certo modo, prematura. Palavras amenas aqui e acolá, contidas manifestações de apreço. Mais na periferia do salão, especulações sobre a causa da morte, descrições as mais fantasiosas sobre como minha mãe me teria encontrado morto em meu quarto. Mais adiante, claro, algumas anedotas e conversas sobre corrupção no governo, a política de juros, o preço do café, a novela das nove etc. Afinal, velório é velório...
Numa cena derradeira, meu caixão descendo à sepultura em meio a lamentos incontáveis. Parentes meneando a cabeça inconformados. Uns pensando: "como pode ter ido tão cedo. Nem um filho ele deixou!" Outros conjecturavam: "Lá se vai, sem ter pago nenhuma das suas dívidas. Acabou se safando!"
Antes que o cemitério se esvaziasse e eu começasse o processo de ser pouco a pouco esquecido pela grande maioria dos presentes, o sereno homem de branco mais uma vez instou a que fôssemos embora e eu anui não menos calmamente.

Assim foi o filme que se passou na minha mente na tarde de ontem. Pena eu não ter conseguido assistir o desenrolar de minha penetração no mundo espiritual.

domingo, 28 de agosto de 2011

Versos cheios

Pobre homem
este que adentra meu quarto
arrastando chinelos e angústias
e cujo silêncio tornou-se comum.

Sufocados seus amores,
estancadas injustas lágrimas,
senta-se à velha escrivaninha
à espera de um verso que lave sua alma.

Pobre homem, à beira dos quarenta,
um coração de velho batendo no peito.
Mas ele não se lembra bem
deter vivido sonhos de criança.

Recorda-se somente de ter vivido meses
na casa da felicidade,
de onde saiu aflito, pisando duro,
e deixando alguém a chorar.

Pobre homem mudo
a quem a vida parece grande demais.
Onde estão seus amigos?
Seus amores, cadê?

Pobre homem de versos cheios
e vida vazia.

domingo, 21 de agosto de 2011

Nada Sei

Existe uma frase muito comum nas páginas das redes sociais, que diz o seguinte: "Quando a gente acha que sabe todas as respostas, vem a vida e muda todas as perguntas".

Parece, de fato, uma excelente frase de efeito. Mas ela tem assumido uma dimensão muito real na minha vida, diante de circunstâncias que tenho vivido ultimamente.

Bem próximo dos meus 37 anos de idade, depois de ter vivido algumas experiências no âmbito da religião e tantas outras no que tange relacionamentos afetivos, sinto-me estranhamente perdido, com a sensação exata de que tudo o que eu pensava saber sobre mim mesmo ou sobre a vida não tem consistência, é uma ilusão que eu criei para alimentar meu ego.

E pior que a sensação de que nada sei, é um certo desespero de não saber também como agir.

Tenho, nesse momento, a exata noção de que preciso rever muitos de meus conceitos, romper com paradigmas, começar a reescrever minha história. Mas não estou sabendo como começar isso.

Confesso minha ignorância a respeito de muitos aspectos de mim mesmo. E dói-me enxergar que tal ignorância, além de frear a minha evolução, feriu pessoas que conviviam comigo enquanto eu achava que estava absolutamente seguro. Eutransformei essa pseudo-segurança em prepotência, arrogância e insensibilidade. Isso fez-me perder a possibilidade de harmonia com a pessoa que, sem dúvida, mais me amou nessa vida e a mim se dedicou com desprendimento.

Agora, num momento em que a solidão penetra o mais íntimo de mim, aborvido por elucubrações as mais diversas, tenho medo, muito medo.

Antes de mais nada, medo da própria solidão. Medo dessa falta que me faz uma mão que segure a minha com carinho e paciência. Medo do tamanho da tarefa que vejo não diante de mim, mas dentro de mim.

Felizmente, coabitando com o medo, há em mim uma brisa de esperança. Essa esperança me diz que é possível, que há um pouco de luz.

Assim espero e peço a Deus que me ajude, de fato, a realizar a tarefa de me reconstruir.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Não vale a pena

Estou longe,
muito longe de minha terra.
Não falo de minha terra natal,
lugar físico onde eu nasci
para viver essa experiência corporal.

Estou longe da terra que sou eu mesmo,
como que vivendo uma experiência de nulidade
e, relação à minha essência verdadeira: o amor.

Em labirintos atordoantes
venho caminhando.
A boca sedenta, o coração acelerado.

A cada curva a certeza de que encontrei
uma felicidade preparada para mim desde sempre.
Mas tudo são miragens, talvez construções mentais.

O que eu quero não existe!
Está por ser feito, carece de laborioso empenho.
E minha mente diz sem cessar: "Não vale a pena!"